segunda-feira, 20 de janeiro de 2014


 
A FAUNA E A FLORA
 
Quem me dera rins flexíveis e muita agilidade de modo a poder saltar para o outro lado da linha ideológica que separa o arco da governação do espaço de governados expoliados.
 
Teria à minha roda gente fina, cordata, educada, frequentaria meios recomendáveis, e não pelintras, sentar-me-ia, confortavelmente, ora nas bancadas da Assembleia ora nas poltronas de Administrações ou Fundações, a expandir o que me brota do cérebro ou flui do meu coração muito filantrópico.
 
Onde me encontro lobrigo apenas miséria e desgraça, enquanto que, passada a linha, os céus são cor-de-rosa e a paisagem verdejante.
 
Ele são oliveiras altas, frondosíssimas, a cobrir facilmente qualquer obra de alvenaria e enchem, até mais não, as arcas da economia própria, nogueiras largas que não dão nozes, é certo, mas facilitam o seu acesso, pereiras tantas que formam florestas, carvalhos gigantescos que cobrem tudo o que à volta houver, soutos, muitos, de loureiros banhados numa aura celeste e silvas tão pouco espinhosas que já se encontram a decorar os bancos.
 
E a fauna, meu Deus, espantosamente exótica, como jamais se viu: coelhos de muitas raças, que vencem os castores em obras de construção, outros tão bravos que, em vez de caçados, são caçadores, lobos mansinhos que mamam em toda a teta, cordeiros sentados nos bancos, cobrando entradas, e grilos, sardinhas, passarinhos, estes pipilando em fios eléctricos, aqueles e aquelas proliferando no desenvolvimento da terra, ar e mar.
 
Previno quem me leia que a minha descrição é pálida, anémica, comparada à realidade deste país de sonho, a lembrar-me um jogo televisivo, popular em França, da descoberta do tesouro, depois de passos decisivos e portas ultrapassadas.
 
Se também tiver desejo de o ver e desfrutar, aconselho uma preparação prévia com leitura de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll e Os Privilegiados, de Gustavo Sampaio.

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