Ciclicamente, coincidindo,
talvez, com fenómenos astrais de equinócio ou eclipse solar, realiza-se, na
mais prestigiada casa de espectáculos, uma sessão solene.
O arvorado chefe aparece na
ribalta e, em férvida exaltação do seu ego, propala quanto fez, numa enumeração
de sucesso em sucesso.
Das bancas do anfiteatro, os
macaquinhos amestrados vão batendo as patitas, ao sinal convencionado da
interrupção da perorata com um golinho de água.
Para cúmulo da tristeza,
surge, por vezes, o idiota útil, que afirma ir fazer diferente, sabendo-se que
serve apenas os interesses que os outros também servem.
O resto, na figura de alguém
acossado pelo tempo e pela senhora presidente, é pitadinha de sal na mixórdia,
nem mesmo assim tragável.
Cá fora, em circuito
fechadíssimo, os que se ganham a vida na pura bisbilhotice comentam entre si,
oralmente ou por escrito, num compadrio confortável.
No espaço mais largo e
poluído da vida, a formigação não pára, no afã fracassado de evitar a sopinha
dos pobres, já sem resposta para tão grande procura.
É de tudo isto que devemos
orgulhar-nos, dizem, pois trata-se da democracia em marcha.
Fúnebre, certamente.
Pouco convencidos, embora
sempre dispostos a engolir seja o que for a troco de uma cerveja, os jovens
vão-se apressando na direcção de Saramago e Maria João Pires: a fuga.
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