terça-feira, 12 de abril de 2022

 

Era ainda manhãzinha e já ela traquinava, revolvendo uma terra com a qual se confundia na cor e nos sulcos que a idade lhe cavara.

Pensei: - Que vida sem descanso, sem marido, sem ninguém! Arrancar umas batatas, ou criar duas ovelhas, justificará esta canseira? Eu, por mim, apaparicava-a, dava-lhe a vida que não tivera…e matava-a, sim, porque roubar-lhe o que sempre conheceu seria sufocá-la num meio onde o ar rarefeito só entrava ao mando de uma dama directora. Julgando compensá-la, ia apenas enterrá-la antes mesmo de ter morrido. Então, como pagar tanto, mas tanto, que lhe devo?

Se sou o que sou, independente, sem compromissos, liberto de sujeições, a ela tudo agradeço, pois enquanto eu medrava, física e mentalmente, o leite me amamentou e a comida sempre a horas, quando me fiz aos estudos. Quem é, senhores pensantes, na verdade superior?

Filósofos, cientistas, arrivistas feitos políticos, onde iríamos ter ideias se faltassem estes humildes a quem vêm explorando século após século, assumindo atitudes de demiurgos iluminados?

A terra é generosa, mas nas mãos muito calosas que a arejam, semeiam, fecundam, acorrendo se tem sede, adubando se tem fome.

Parece que chegou o momento de parar, refletir e mostrar gratidão.

Eles passam bem sem nós, nós, sem eles, é que não.