Era ainda manhãzinha e já ela
traquinava, revolvendo uma terra com a qual se confundia na cor e nos sulcos
que a idade lhe cavara.
Pensei: - Que vida sem
descanso, sem marido, sem ninguém! Arrancar umas batatas, ou criar duas
ovelhas, justificará esta canseira? Eu, por mim, apaparicava-a, dava-lhe a vida
que não tivera…e matava-a, sim, porque roubar-lhe o que sempre conheceu seria
sufocá-la num meio onde o ar rarefeito só entrava ao mando de uma dama
directora. Julgando compensá-la, ia apenas enterrá-la antes mesmo de ter
morrido. Então, como pagar tanto, mas tanto, que lhe devo?
Se sou o que sou,
independente, sem compromissos, liberto de sujeições, a ela tudo agradeço, pois
enquanto eu medrava, física e mentalmente, o leite me amamentou e a comida
sempre a horas, quando me fiz aos estudos. Quem é, senhores pensantes, na
verdade superior?
Filósofos, cientistas,
arrivistas feitos políticos, onde iríamos ter ideias se faltassem estes
humildes a quem vêm explorando século após século, assumindo atitudes de demiurgos
iluminados?
A terra é generosa, mas nas
mãos muito calosas que a arejam, semeiam, fecundam, acorrendo se tem sede,
adubando se tem fome.
Parece que chegou o momento de
parar, refletir e mostrar gratidão.
Eles passam bem sem nós, nós,
sem eles, é que não.