Lembro-me, demasiado bem, da
falação a que assisti há anos, numa prestigiada universidade francesa, em
vésperas do golpe de estado contra Salvador Allende.
Chovia, na altura, a
propaganda raivosa, o boicote económico ia crescendo, os patrões dos
transportes paralisavam o país, as donas de casa burguesinhas saiam à rua em
marcha de caçarolas, a ingerência americana, evidente na embaixada e ITT, era ostensiva,
para não dizer obscena.
Creio que há quem se lembre,
ainda, do que a seguir aconteceu: ditadura do Pinochet, a crueldade arripiante
dos estádios de concentração, a caça ao homem de casa em casa, as torturas e
assassinatos numa dominação de terror, o roubo de crianças aos pais, o apoio despudorado
americano, com remessa de carradas de dinheiro e a ajuda de sábios, de que
destacarei Hayek e Milton, prémios Nobel da economia, que, mesmo mortos, são
actuais mentores dos nossos governos neoliberais.
E tudo porquê?
Porque Allende, socialista
de um socialismo honesto, queria fazer voltar ao povo o que ao povo pertencia.
Pois o senhor conferenciante
de que falo, especialista em língua, cultura e civilização da América Latina,
trazia para mostrar, da viagem de estudo que por lá realizara, zonas imensas de
imenso guano, ele e sua esposa, ambos alcandorados em rochas de grande altura,
desfiles populares que considerava folclóricos e muitas outras ilustrações do
género.
Foi tamanha a náusea que me
deu para barafustar, coisa nada adequada a tão nobre e erudito sítio.
Qual é a razão que me retorna
ao passado?
É ter ouvido, em emissão
televisiva, um comentador político que, ao assistir à repetição da tragédia,
nos dias de hoje, agora, na Venezuela, remata a análise do momento com a conclusão
brilhante, apesar da colossal derrota nas eleições municipais, de que o
chavismo falhou, como seria de esperar de um regime anti-democrático e
autoritário.
Desconhece, mas que importa,
a notória regressão da pobreza, os progressos na saúde e na educação para
todos, o aumento de salários dos mais pobres, a instituição de uma pensão de reforma a quem não tinha, o esforço continuado na consolidação de uma autêntica democracia
participativa.
São estes factos
reconhecidos e atestados por organizações e observadores internacionais, entre
os quais posso destacar a UNESCO.
Mas o senhor comentador não
hesitou na bacorada, com a cara de parvo que lhe é habitual e a correlativa
impância do seu ego e da sua auto-satisfação.
Tem por si, é certo, o não
ser professor universitário, embora o pudesse ser, dado o tanto à-vontade com
que se expande sobre diferentes temas.
Foi, contudo, encartado pela
Universidade Nova, é co-fundador de uma revista de turismo duvidoso, com bares
gay e quejandos, colunista bem pago de variados jornais, fazedor de opinião,
com chorudos proventos que lhe permitem sustentar a numerosa filharada, seu
gosto e orgulho, frequentemente apregoados
Esta é, pois, a informação
que temos, com uma miríade de papagaios a repetir, sem qualquer contestação, o
que a Reuters quer que se diga.
Sem comentários:
Enviar um comentário